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terça-feira, 8 de janeiro de 2013

"Vou te bater, Giovanna!"


E, de repente, a voz de uma mãe ecoa no banco logo atrás do meu no ônibus:

- Ah, não, Giovanna! Eu vou te bater!

Eu estava indo ao Centro pela manhã. Em cima do Viaduto da Lagoinha, a criança começou a passar mal e a golfar na mãe.

- É a segunda vez já que você faz isso! Toda vez que pega ônibus é isso!

A garota tem no máximo três anos - observei na hora que desci no meu ponto. A fala da mãe parece acusar a menina de sempre fazer isso de propósito. Em um momento no qual a guria de colo precisa de apoio, a mãe pensa na reprimenda "justa" e imediata.

- Agora, cê vai pro médico assim mesmo, toda suja!

O que me fez refletir sobre esse ofício deveras trabalhoso que é ser mãe, ser pai. Tudo bem que a mãe poderia ter ficado puta da vida com a menina passando mal dentro do ônibus e deixando o coletivo com aquele típico cheiro de leite talhado. Mas percebi uma reação exagerada da mãe com a filha.

- Vou te bater, Giovanna!

Fiquei com aquilo na cabeça. Ecoando. Essa frase aí em cima. Donde concluí que, realmente, não é qualquer pessoa que pode ser mãe ou pai, por mais que queira, por mais que deseje.

São em situações extremas como essa que se percebe o deslocamento de sentimentos. Em vez do apoio, a vontade de esganar; em vez de segurar a testa da menina para ajudá-la no vômito, age com alguma indiferença que está mais para a ignorância. Resultado disso é que a menina se suja, a mãe se suja, a acompanhante da mãe ao lado tem sua bolsa toda sujada. Mas está mais para a sujeira de espírito e de caráter que a bagunça do refluxo da garotinha.

- Vou te bater, Giovanna!

O cheiro de vômito infantil ficou disseminado no coletivo. Desci, olhei de relance para a menina. Rosto redondo, olhos amendoados, parecendo serem castanhos claros. A mãe tinha um físico magro, parecia (repito, parecia) ser adolescente ou uma jovem de 18, 19 anos. Seria uma impaciência juvenil contra um evento que lhe causa contragosto? Não quero buscar o motivo da reação dessa a quem atribuo a maternidade da criança - pode ser, pode não ser. Mesmo não sendo, essa mãe está mais para algoz do que para uma singela distribuidora de afeto.

E pensar que atos de tamanha nervosia infelizmente não são raros.

Um comentário:

Dri Torres disse...

Caramba... chorei imaginando a situação.

Já vi tantas assim. Já vivi algumas também. E nós, de fora do contexto, quem somos pra julgar? Como essa mãe foi criada, qual foi o sistema que moldou a sua maternagem? Terá um pai para compartilhar a responsa? Está apenas seguindo o que a própria mãe dela fez?

Em tempos de tanta violência, me pego pensando em como eu preciso desconstruir diariamente meu autoritarismo, minha agressividade - que não nasceram comigo e se nasceram foram bem reforçadas por uma criação também autoritária e agressiva.

Todo dia quando estou lidando com meu filho eu sou obrigada a enfrentar o espelho e olhar para a minha sombra, para esse lado que eu gostaria que não existisse. E tentar desconstruir, lembrando que dá sim para comunicar sem violência, respeitando a criança e a mim mesma.

Não é nada fácil, mas tem sido revelador e transformados. Eu estou me criando pelo meu filho. E isso é mágico também.

Beijos, querido. <3