Talvez hoje, 23/24 de outubro de 2010, eu tenha entendido o sentido da frase que utilizo aqui no blog, letra de João Ricardo (Secos & Molhados).
Depois de uma pequena grande polêmica envolvendo a Fundação Municipal de Cultura (mais exatamente à Thaís Pimentel, sua presidente), este órgão da Prefeitura de Belo Horizonte resolveu trazer Zé Celso Martinez e seu projeto de circulação Dionisíacas 2010. Já haviam me falado do Zé Celso - aliás, a primeira vez que eu ouvi falar dele foi por meio da boca de Glauber Rocha, outro louco nada febril.
Todas as pessoas com quem conversava referendava o trabalho do Zé Celso. Esse cara fez história - googleia aí, tô com preguiça de pôr link, e já é demasiado tarde. Pois bem, a Fundação resolveu trazer o Zé Celso e o instalou em uma arena na... Barragem Santa Lúcia, de frente para o Morro do Papagaio!
Inusitado? No mínimo. Mas foi uma atitude muito acertada. Não é teatro burguês - por mais difícil que lhe seja a compreensão. Por isso, a aproximação com a favela e a sua gratuidade na entrada. Cheguei 17h40 para a peça que ia começar às 18h. Deu uns 40 minutos de atraso, mas é coisa superada. A peça que eu vi é CACILDA!!, em justa e honrosa homenagem à grande atriz do teatro e da Atlântida Cacilda Becker. Só que a maneira como o Zé Celso faz é, no mínimo, antropofágica na sua essência.
Em meio à encenação musical - parêntesis: eu detesto musicais à lá Broadway, acho tosco; mas essa apresentação da trupe do Zé Celso foi um musical, mas muito diferente do estereótipo -, via-se a exploração de ironias e sarcasmos, a nudez como linguagem/metáfora, flores que despetalam, orgia, vermelho, ideologia cristã e uma aforia ao Teatro Brazyleiro. Uma loucura.
Não, não intuo resenhar sobre CACILDA!!, é impossível de se fazer tal tipo de coisa. Palavras limitam, cerceam, chegam às vezes a tolher. É melhor que se sinta, que se experimente, que se veja e que seja visto - há muito dessa interação em cena, o público não é meramente passivo e consumidor, mas é um elemento a mais da peça e pode influenciar - ainda que minimamente - na história.
CACILDA!! é amor, paixão, lascívia, desejo, necessidade, vontade, necessidade, desejo, necessidade, vontade, necessidade. Por meio dessa peça sente-se a volúpia humana como condutora de suas atitudes. É mais do que isso, apenas. É uma sensação que, ao mesmo tempo que é pesada (sugam-se as energias da plateia até esta ficar exaurida), é um misto de alívio com condenscendência.
Agora entendo porque Zé Celso é cultuado. Não se faz um trabalho desse à toa - é de se ficar estático, incomodado, mas interessado com tudo. Ele choca, provoca, insinua e xinga. Vomita diretrizes. Provoca o despertar de inconscientes e subconscientes coletivos adormecidos. Estimula a criticidade. Faz rir, pensar, chorar e, no final de tudo, aplaudir tudo de pé. Porque, caso de CACILDA!!, encena-se a biografia de alguém importante, relevante, para a nossa Cultura Brazyleira. Por que não levar esse culto a cada pessoa? Por que não devotar um pouco da nossa devoção para com as estrelas para os nossos entes mais próximos? Faz-me pensar o quanto valorizamos uma pessoa e a sua relação com o quanto ela quer ser valorizada. É sempre mais, uma tarefa contínua, árdua e que não pode ser egoística, egoica.
Bom, do alto da madrugada, sinto que não sou mais o mesmo. Já não sou desde que descobri Mutantes, Miguel de Deus, Teatro do Oprimido e, agora, Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona. São coisas que se somam, que contribuem para que eu me demova da estaticidade, que eu prefira a instabilidade emocionante à tranquilidade paquiderme. Sou carnívoro, mas não sou agressivo. Gosto de carne, de alma, de gente, de pessoas, de valores e de convivências. De experiências, de sentimentos. E não se pode sentir isso vendo apenas algumas peças fracas e risíveis da campanha de popularização do teatro, ou apenas ouvindo o que há no mainstream. Leia-se, por favor, que não sou contra a isso, mas me oponho à conduta de se ater apenas a isso - como sou contra também ser somente alternativo. Alternativo a quê?
Chega, então. Extasiado com todo esse sentimento que me corre nas veias, vou descansar. Mas não paro, não me canso. Me lembra uma música do Marcos Valle, Garra: "Mas eu vou vencer / Se eu não morrer". Só vou morrer mesmo se eu me sentir estático. Enquanto houver célula respirante, aqui haverá um Bruno que não sabe, primeiro, o que é estabilidade e, segundo, que deseja a mudança não apenas por mudar, mas que a deseja como um valor que seja constantemente construído - interna e externamente.
Obrigado, Zé Celso, pela expetacular esperienzia de te ver num Teatro de Extádio. Socorram-me se um dia eu enloquecer de vez, mas me deixem, ainda assim, louco. Extasiado. Emocionado. Enfim.
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